27.7.08

The courtier and the heretic - Matthew Stewart


Fazia algum tempo que não tocava em um livro sobre filosofia e ler The courtier and the heretic (O cortesão e o herege), de Matthew Stewart, foi muito bom. Nele, o autor confronta dois filósofos do século XVII, Leibniz e Spinoza. Sua tese é a de que a filosofia de Leibniz seria uma reação à filosofia do último e que, no fundo, Leibniz seria mais spinozista do que gostaria de admitir.

Para quem não tem idéia nenhuma de história da filosofia, Spinoza é o “herege” do título. Ele foi excomungado pela comunidade judaica de Amsterdã e sua filosofia acusada de propagar o ateísmo, pois ela afirmava que Deus seria o mesmo que a natureza, ou seja, que não haveria um criador exterior à sua criação e que tudo ocorreria de forma necessária. Bem e mal seriam idéias que surgiriam devido à nossa limitação de seres finitos e, com algum esforço, tudo poderia ser explicado racionalmente. Para Spinoza, pensamento e matéria são a mesma coisa considerada de pontos de vista diferentes. Quando a matéria morre, o pensamento também perece, por isso, a morte seria o ponto final, não haveria paraíso e vida no além. Aquilo que Spinoza considera a felicidade é uma existência dedicada à realização intelectual.

Leibniz, o "cortesão", por sua vez, prega que Deus existe sim e que o mundo no qual vivemos é o melhor dos mundos possíveis porque o criador o escolheu entre um universo de outros mundos possíveis, portanto,  nada poderia ser diferente do que é. Aquilo que os seres humanos chamam de mal é algo relativo, pois, na soma final, sempre haveria mais bem do que mal em nosso mundo.

O livro é divertido, muito bem escrito e o autor deixa claro que não aprecia muito Leibniz que a todo momento retrata como alguém extremamente vaidoso e interessado apenas em obter benefícios vendendo suas idéias e planos mirabolantes para os nobres que não se cansa de bajular. Enquanto isso, Spinoza é o retrato da virtude, a verdadeira idéia de filósofo. Ele vivia em quartos alugados e polia lentes durante o dia para pagar suas tigelas de mingau e eventuais canecas de cerveja aguada.

Devo admitir que simpatizo muito com a filosofia de Spinoza, seus textos não primam pelo aspecto literário, mas suas idéias são extremamente sedutoras. Gosto dos filósofos que dizem que o importante é o aqui e o agora, que é preciso engolir a pílula ou jogá-la fora, não dourá-la.

Do final do livro:

“Leibniz foi um homem cujas fraquezas eram tão grandes quanto as suas enormes virtudes. No entanto, foi sua ganância, sua vaidade e, acima de tudo, sua carência insaciável e demasiadamente humana que tornou sua obra tão emblemática. Com a promessa de que a superfície cruel da experiência oculta a mais bela e agradável verdade, um mundo no qual tudo acontece por um motivo e tudo o que ocorre é para o bem geral, o fascinante cortesão de Hanover transformou-se no filósofo do homem comum. Se Spinoza foi o primeiro grande pensador da era moderna, então, talvez Leibniz devesse contar como o primeiro ser humano.

Spinoza, por outro lado, foi marcado desde o início como uma ave rara. Devido à sua estranha auto-suficiência, à sua virtude sobre-humana e ao seu desprezo pela multidão, não poderia ser diferente. No entanto, a mensagem de sua filosofia não é a de que nós conhecemos tudo o que há para conhecer, mas que não há nada que não possa ser conhecido. O ensinamento de Spinoza é o de que não há um mistério impenetrável no mundo, nenhum ‘além’ acessível apenas por alguma revelação ou epifania, nenhuma força oculta capaz de nos julgar ou afirmar, nenhuma verdade secreta sobre tudo. Há apenas um acúmulo lento e contínuo de muitas pequenas verdades e a mais importante dentre elas é que não precisamos esperar nada para sermos felizes neste mundo. Sua filosofia é uma filosofia para filósofos, que são tão raros hoje como no passado.”

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