22.7.11

Danilo Kis - The Encyclopedia of the Dead


Depois de Early Sorrows, li este livro do Danilo Kis (1935-89).

"A Enciclopédia dos mortos" é o título do conto que dá nome a esta coletânea. Todos os textos falam sobre a morte e as fatalidades da vida. Há o enterro  de uma prostituta que provoca uma grande comoção em um cemitério; o despertar de um longo sono e a morte definitiva de três homens considerados santos; um espelho misterioso que revela um acontecimento trágico; um livro cuja interpretação influencia gerações.  Danilo Kis costuma mencionar diferentes autores, personagens de outras obras e faz alusões a fatos históricos que nem sempre são muito conhecidos e que tornam algumas coisas um pouco "herméticas" (para mim), mas isso não reduz a aura de mistério e encanto dos textos. 

Meu conto preferido é mesmo aquele que dá o título ao livro. Ele narra o sonho de uma mulher cujo pai faleceu há pouco tempo e que ainda não se recuperou de sua perda. Em seu sonho, ela é conduzida até  o que parece ser uma grande biblioteca. Ela é dividida em várias salas, cada sala é dedicada a uma letra do alfabeto. A biblioteca, na verdade, contém apenas os volumes da "Enciclopédia dos mortos", obra que preserva a história das pessoas que morreram. A mulher se dirige para a sala de letra "M" e encontra o volume com a história de seu pai. Ela lê sobre seu nascimento, infância, casamento, cada mínimo detalhe de sua vida está encerrado naquelas páginas até o momento de sua morte. É um conto bonito.

Eis um trecho que achei particularmente belo, reflexões feitas pela mulher enquanto procura se lembrar do que leu na Enciclopédia:

"Não tentarei contar tudo de que me lembro, tudo da forma como é contado e descrito ali - a data e a maneira como foi realizado o noivado, o casamento tradicional para o qual o dinheiro não é problema, a gama de costumes pitorescos que fazem parte da vida: isso tudo pareceria insuficiente, fragmentário, comparado com o original. No entanto, não posso deixar de mencionar que o texto oferece uma lista das testemunhas e dos convidados, o nome do pastor que realizou a cerimônia, os brindes e as canções, os presentes e quem os deu, a comida e a bebida. Em seguida, cronologicamente, vem o período de cinco meses, entre novembro e maio, no qual os recém-casados se mudam para Belgrado, a Enciclopédia inclui o andar e a disposição dos móveis, o preço do fogão, da cama e do guarda-roupas, bem como certos detalhes íntimos que nesses casos são sempre tão parecidos e ao mesmo tempo tão diferentes. No final - e é isto que considero ser a principal mensagem do compilador - nada na história da humanidade se repete, coisas que, à primeira vista, parecem iguais não chegam nem mesmo a ser similares; cada indivíduo é um universo em si mesmo, tudo acontece sempre e jamais, tudo se repete ad infinitum e ainda assim é único. (É assim que os autores do majestoso monumento à diversidade que é A Enciclopédia dos Mortos sublinham o particular, é por isso que cada ser humano é sagrado para eles)."


6 comentários:

tatiane disse...

Gostei da Enciclopédia, seria bom se existisse. Fiquei pensando no meu pai, no anos que ele viveu, no tempo que eu convivi com ele e no tempo que eu me dei por gente, realmente foi muito pouco...

Karen disse...

Tatiane, também gostaria que ela existisse, mas mesmo que ela seja só uma ficção, as pessoas ainda continuam vivas dentro de nós depois de partirem. :)

Thais Menandro disse...

Me fez lembrar de um filme do Kore Eda, acho que é Depois da Vida. Nele, cada pessoa ao morrer é levada a buscar uma lembrança de sua própria vida que depois vai se tornar seu filme. É muito lindo.

http://saia-justa-georgia.blogspot.com/ disse...

Karen gostei do livro. Deve ser muito interessante.

Bom fim de semana


Abracos

Karen disse...

Thaís, esse é um filme que gostaria de assitir!

Georgia, sim, ele é! Bom fim de semana!

Darlan M Cunha disse...

Há vários anos li um livro do Danilo Kis (parte sérvia da Iugoslávia)- Jardim, cinzas. Textos delicados que encontrei numa biblioteca, e que, ainda frente à estante, decidi levá-lo para casa, instintivamente, como me aconteceu com "Lavoura arcaica", do Raduan Nassar, um autor que hoje é cultuadíssimo nacional e internacionalmente, embora evite qualquer badalação, um autor que quase ninguém sabia de sua existência.

Um abraço.
Darlan M Cunha